segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

A lenda de Damasinha

A Lenda de Damasinha
A lenda de Damasinha é contada por Aluizio Alves no livro “Angicos” e repetida, com algumas alterações, por Zélia Alves no livro “ Angicos, ontem e hoje”. Vamos transcrevê-la para cá, e, em um artigo posterior, vamos comparar as informações que a transmissão oral foi, a cada momento, modificando com os dados colhidos em registros da Igreja. Uma tragédia na família Lopes Viégas. Segue a transcrição.
Contam os antigos que Damasia Francisca Pereira, mulher de Francisco Lopes, parente próximo da família fundadora de Angicos, vivia em perfeita calma na pobreza honrada do seu lar.
Essas duas existências, conjugadas eternamente pelo matrimônio, pareciam ter sido predestinadas, uma à outra, para as doçuras de uma vida feliz, entre os lazeres da criação, e os momentos de repouso.
Um dia, porém, tudo mudou. O marido nega à esposa fiel e dedicada os carinhos costumeiros, passando a tratá-la com grosseria inaudita. Damasinha, alma privilegiada de mulher, boa filha, boa amiga, e que sacrificara o tempo da mocidade às esperanças de um casamento venturoso, compreende a transformação radical, mas assim mesmo, sofre com paciência e resignação.
Uma palavra de desespero sua boca não pronuncia. Um gesto de arrependimento e tortura íntima nuca se lhe escapou. Cada hora que passa, mais Francisco Lopes se revela indelicado e estranho.
 Em 1843, realizava-se na vila a festa do padroeiro. Toda a população católica acorria ao templo, recitando as suas preces de salvação e de fé. Francisco Lopes convida a esposa para assistirem aos festejos do santo patriarca.
Chegando a Angicos, tomam parte nas cerimônias religiosas, como todos os anos. Na véspera do encerramento do novenário, a mãe de Damasinha surpreende na fisionomia da filha o martírio supremo.
Procurou sondar-lhe o coração. Sentiu-lhe mais forte o palpitar da alma, mas, nada obteve, senão a confissão deliciosamente mentirosa de que em sua casa pobre cantava e reinava a felicidade. Longe, porém, de se enganar, o coração materno advinha a tragédia. Vê estampado no rosto da filha o signo involuntário da tortura irremediável.
E como buscasse retê-la a seu lado, livrando-a da grosseria inconsciente do marido, recebe da filha extremosa e esposa fiel a mais resignada negativa.
Voltou o casal para o sito Santa Cruz, onde ficava a casa de sua residência, hoje de Dr. Gilberto Wanderley.
No caminho, Damasia compreende que o desenlace se aproxima. O marido, momento a momento, ferreteia-a com a ponta do punhal. E não se enganou...
Logo ao chegarem, Francisco Lopes manda-a deitar-se na mesa da sala de jantar. A vitima obedece sem relutância.
E ali mesmo, fria e barbaramente, a arma assassina degola a mulher heróica.
Cercando o cadáver de dois círios bruxuleante, o tresloucado Lopes vai à casa do seu compadre João Felipe da Trindade, figura de saliência na vida municipal, e comunica-lhe, sorrindo, o fato hediondo.
Abriu-se inquérito, ainda hoje existente no cartório de Angicos. Francisco Lopes confirmou o assassínio em palavras desconexas.
A morte de Damasinha ecoou dolorosamente. As suas virtudes foram revividas por todos os que a conheciam.
A mesa do seu sacrifício e uma pedra que se alteava do ladrilho irregular, ficaram indelevelmente manchados pelo sangue inocente.
E, diz a lenda, quando o cadáver, acompanhado por grande multidão, chegou à Favela, arrabalde da vila de onde esta se desenhava lindamente, os sinos dobraram sem que ninguém lhes tocasse...
Francisco Lopes, tendo recebido um jato de sangue no peito, viu transformar-se quase que numa única chaga, e, louco, terminou os seus dias miseravelmente. Ainda hoje, entre o tímido fanatismo do nosso povo, existe quem levante os olhos para o céu, numa oração fervorosa à santa Damasinha....
No próximo artigo traremos para cá os registros paroquiais sobre os personagem dessa tragédia, para fazer algumas correções.

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