domingo, 10 de abril de 2011

A Ilha de Manoel Gonçalves, há duzentos anos atrás

A Ilha de Manoel Gonçalves, há duzentos anos atrás
João Felipe da Trindade (jfhipotenusa@gmail.com)
Professor de Matemática da UFRN e membro do INRG
Em 1803, em Recife, faleceu Dona Maria Theodora Moreira de Carvalho, avó de Maria Theodora, personagem  da Revolução de 1817, e no ano seguinte seu esposo, Domingos Affonso Ferreira, casal que em 1797 comprou, em sociedade com o genro, Coronel Bento José da Costa, pai da noiva da revolução, vastas terras no sertão do Assú. Foi inventariante o próprio Bento José da Costa. Por isso, Bento solicitou, somente em 1810, avaliação dos bens como segue:
Diz Bento José da Costa por si, e como inventariante dos bens do casal dos falecidos Domingos Affonso Ferreira e Dona Maria Theodora Moreira de Carvalho, e co-herdeiro do mesmo, que o sobredito casal, de sociedade com o suplicante, tem no Sertão do Assu, Distrito da Vila Nova da Princesa, três Fazendas situadas com gados vacuns, cavalares, escravos, e mais acessórios, correspondentes as mesmas denominadas Entradas, Amargoso, e Cacimbas do Vianna, assim como ilhas, salinas, pesqueiras, e mais terrenos anexos que foram apontadas pelo Procurador bastante do suplicante, cujas propriedades as houve por compra feita a Francisca Rosa da Fonseca, e por que o suplicante quer avaliar estes bens para concluir o inventário, devem ser todas as Fazendas, terras, tudo o mais correspondente a dita compra avaliado junto na forma da compra, pelos avaliadores daquele território, onde tudo se acha situado, requer o suplicante a Vossa Senhoria mande passar carta precatória para as justiças de dita Vila para em cumprimento fazer avaliar tudo, e remeter a avaliação a este Juízo.
O Procurador nomeado por Bento, José Álvares Lessa, solicitou que, por conta da distancia e outros inconvenientes, a avaliação fosse feita na Ilha de Manoel Gonçalves, onde ele residia. Foram nomeados para avaliadores o Ajudante José Caetano da Costa e o Alferes Antonio Caetano Monteiro. Segue o termo de juramento de José Álvares Lessa.
Aos vinte e cinco dias do mês de Agosto de mil oitocentos e dez anos, neste lugar da Ilha, denominada de Manoel Gonçalves, termo da Vila Nova da Princesa da Capitania do Rio Grande, da Comarca da Paraíba do Norte, em casa de residência do dito Procurador para onde foi vindo o Juiz de Órfãos, o Alferes Felipe Manoel da Cunha, comigo escrivão do seu cargo, adiante nomeado, e os avaliadores nomeados para efeito de se avaliarem todos os bens conteúdos na carta presente retro: e aí estava presente o Comandante José Álvares Lessa, procurador bastante do Coronel Bento José da Costa, àquele deferiu, o dito juiz, o juramento dos Santos Evangelhos em um livro deles na forma do estilo, e por ele lhe encarregou que com boa consciência  declarasse os bens conteúdos no despacho retro, e todos os mais que neste Distrito, e termo houvesse pertencente ao casal do falecido Domingos Affonso Ferreira de sociedade com seu genro Bento José da Costa da predita compra: o qual juramento sendo por ele procurador recebido assim o prometeu fazer, e cumprir debaixo do mesmo juramento com a verdade que costuma; e sendo lhe lido este seu juramento o assinou com o dito juiz; e eu Manoel de Mello Montenegro Pessoa, escrivão de órfãos  o escrevi = Cunha= José Álvares Lessa.
Na seqüência, o Procurador, e Comandante da Ilha de Manoel Gonçalves, administrador das propriedades do casal falecido, no Sertão do Assú, José Álvares Lessa, descreve todos os bens com os valores vistos e avaliados pelos sobreditos avaliadores. Entre os bens descritos listou os seguintes: machados, enxadas, foices, enxós, trado de abrir pipas, verrumas, serrotes, serras, ferros de calafete, caldeiras de ferros, tinas, balanças, carros com suas cangas e várias barcaças e canoas. Embora o documento seja riquíssimo em informações sobre todas as ilhas, rios, pesqueiras, salinas e fazendas, nos interessa para este artigo, e neste momento, a descrição da Ilha de Manoel Gonçalves, pois, sempre alguém me pergunta que tamanho ela tinha. Assim, logo após a descrição dos bens existentes na Ilha, segue, no título de terras, em primeiro lugar, a Ilha de Manoel Gonçalves, de onde se administrava todo o restante, e posteriormente as outras propriedades assim denominadas: Ilhas do Lagamar e Coroa Grande; Ilha do Balthasar; Ilha do Janduhín; Ilha do Madeira; Ilha do Tubarão e Tubarãozinho; Ilha de Fernando; Pontal de Guamaré; Ilha do Pisa Sal; Ilha de Santa Anna; Ilha das Quatro Bocas; Ilha de Macáo; Salinas dos Sítios das Barreiras, Armazéns, Cambôa do Sal e Trapixe, em uma única propriedade; e as Fazendas Entradas, do Amargoso, e Cacimbas do Vianna
Declarou o dito Procurador Inventariante mais do dito casal, neste termo,  na conformidade da dita compra e sociedade, a propriedade mencionada da terra toda da Ilha denominada = de Manoel Gonçalves = com trezentas braças de largura de Norte a Sul; um quarto de légua de comprimento de Leste a Oeste, ou de Nascente e do Pontal do Rio Arrombado ao Poente até o da Barra do Rio do mesmo nome de Manoel Gonçalves ao longo, e paralelo da Costa do Mar, de que é lavada pelo lado Norte: com água doce dentro, pesqueiras de currais de peixe na Costa do Mar; vinte pés de coqueiro, casa de telha e taipa, com cômodo da assistência do dito Administrador, e Procurador Inventariante, armazém de peixe seco, senzala dos pretos escravos, oratório de se pedir missa com três ornamentos roxo, branco, e encarnado; cálice, e patena de prata; castiçais, e ramalhetes prateados no altar: tudo visto e avaliado pelos avaliadores por preço e quantia de um conto e seiscentos mil réis, com que sai 1:600$000.
Ainda no título de escravos, havia um total de 18, sendo 15 pretos de Angola, um preto crioulo, uma preta de Angola, Maria, de 30 anos e um escravinho Luiz, de três anos, filho da dita Maria. As idades dos adultos variavam de 14 anos até 70 e tantos anos; e os preços de cada um, de trinta mil réis (o mais velho e o escravinho) até cento e cinqüenta mil réis (Maria).
Pela falta de outros prédios, na dita Ilha, suspeito que não moravam outras pessoas naquela data, exceto o Administrador, e os escravos. Acho, também, que algumas pessoas com sobrenome Lessa que depois surgiram na redondeza deviam ser parentas do dito Procurador José Álvares Lessa, inclusive a esposa do Capitão João Martins Ferreira, que administrou, posteriormente, as propriedades de Bento, Dona Josefa Clara Lessa.

Prof. João Abner e Thomaz Bengala

Prof. João Abner e Thomaz Bengala
João Felipe da Trindade (jfhipotenusa@gmail.com)
Professor de Matemática da UFRN e membro do INRG

Durante o ano de 2010, tive várias conversas com o Professor João Abner, o homem das águas, dos recursos hídricos e da transposição do Rio São Francisco, que versaram, principalmente, sobre Genealogia. Ele vinha buscando, incessantemente, informações sobre seu ascendente Thomaz Pereira de Araújo, mais conhecido por Thomaz Bengala. Para Abner era um mistério não descobrir quem eram os pais de Thomaz. Achei que seria fácil encontrar e, por isso, vasculhei os livros de Olavo de Medeiros, Sebastião Rocha, Pery Lamartine, José Augusto, Dom Adelino, além de alguns registros da Igreja.

João Abner quer descobrir de onde veio Thomaz Pereira de Araujo, Thomas Bengala, como ele fala. Segundo Abner, Thomaz era casado com Rita Regina de Vasconcelos, pais de Bemvenuto Pereira de Araújo (bisavô de Abner) e Vivaldo Pereira de Araújo (pai de Vivaldo que era pai de Cortez Pereira).

Dos descendentes de Thomaz de Araújo Pereira, o Patriarca do Seridó, havia um Thomaz Pereira de Araújo, famoso, que era padre, e nasceu em 14 de janeiro de 1809, e foi batizado em 16 do mesmo mês e ano. Eram seus pais Antonio Pereira de Araújo, filho de João Damasceno Pereira e Maria dos Santos Medeiros, e de Maria José de Medeiros, filha de Thomaz de Araújo Pereira (2º) e Thereza de Jesus. João Damasceno e Thomaz, irmãos, eram filhos de Thomaz de Araújo Pereira (1º), português da Vila de Viana e de Maria da Conceição de Mendonça, da Paraíba. Assim, o padre era duplamente bisneto do Patriarca, além de ser neto de Rodrigo Afonso de Medeiros Mattos, outro português, da Ilha de São Miguel.

No livro de Bianor Medeiros, Paróquia de Acari, vamos encontrar uma escritura de perfilhação que fez o Vigário Thomaz Pereira de Araújo, datada de 1869, onde ele declara, que por fragilidade humana, havia tido seis filhos em mulheres solteiras. No livro constam os nomes das ditas filhas.

Os descendentes do Patriarca se espalharam por várias localidades do Rio Grande do Norte e adjacências. Aqui em São Gonçalo, encontramos o filho José de Araújo Pereira que era casado com Elena Barbosa de Albuquerque, filha de Hipólito de Sá Bezerra, também da Vila de Viana, e Joanna Bezerra de Albuquerque. Um dos filhos do casal se chamava Thomaz e nasceu em 1771.

Lá em Macau, vamos encontrar um Thomaz de Araújo Pereira. Diz um registro de batismo: Sebastião, filho legítimo de Thomaz de Araújo Pereira e Joanna Maria do Sacramento, naturais, ele do Seridó, ela desta, e nela moradores, nasceu aos vinte e um de janeiro de mil oitocentos e trinta e sete, e foi batizado com os Santos Óleos na Povoação de Macau, desta Freguesia, aos quatro de abril do dito ano, pelo Reverendo Frei José de Santo Alberto, de minha licença; e foram padrinhos José Martins Ferreira e Josefina Maria Ferreira, casados. Do que para constar mandei fazer este assento, e por verdade assino. O Vigário João Theotonio de Sousa e Silva. Esses padrinhos eram meus trisavós.

Nos livros de registros de Santana do Mattos encontramos o casamento de uma filha de Berardo ou Beraldo de Araújo Pereira, um descendente do Patriarca.

Às onze horas e três quartos da noite do dia vinte e oito de fevereiro de mil oitocentos e setenta e sete, no Sítio Remédio, desta freguesia, de licença do respectivo vigário da freguesia padre Ladislau Adolfo Salles e Silva, confessando primeiro o nubente, deixando de confessar a nubente, pela hora, e examinando ambos em doutrina católica, e em todos os mais servatis servandis, uni em matrimônio, aos contraentes  Pedro José de Sousa e Marianna Benigna  de Araujo, ele filho de João Avelino de Sousa, falecido, e Beatriz Maria da Conceição, ela filha de Berardo de Araujo Pereira e Thereza Maria de Jesus, deixando de dar as bênçãos nupciais, por me ter sido proibido pelo respectivo  pároco, em razão de ser tempo de quaresma, quando são elas proibidas, sendo testemunhas do casamento Manoel Thomas Pinheiro e Joaquim Thomas Pinheiro, ambos casados, e desta freguesia. Assim mais, já sendo eu pároco desta Freguesia, às onze horas da manhã do dia treze de novembro do ano supra mencionado, no Sítio Conceição de dona Bernarda, desta Freguesia, dei as bênçãos nupciais aos nubentes supra mencionados, em tudo servatis servandis; sendo testemunhas as mesmas que tinham sido do casamento; do que tudo para constar fiz este  assento, e para firmeza nele me assino. O vigário Antonio Germano Barbalho Bezerra.

É nos livros de Santana do Mattos que encontramos registros de casamentos de dois filhos de Thomaz Pereira de Araújo, o Thomaz Bengala.

Às sete horas da noite do dia vinte e três de novembro de mil oitocentos e setenta e cinco, no sítio Desterro, da Freguesia de Acari, uni em matrimônio e dei logo as bênçãos nupciais, em tudo servatis servandis, juxta tridentinum, aos contraentes Manoel Jacintho da Silveira Borges, meu paroquiano, e Maria Regina de Miranda, da Freguesia de Acari, ele filho legítimo de Jacintho José Thomas da Silva e Anna Clara da Silveira, já falecidos, e ela filha legitima de Tomaz de Araújo Pereira, já falecido e Rita Regina de Miranda, presentes por testemunhas, Manoel de Albuquerque Galvão e Joventino da Silveira Borges, ambos casados, e da Freguesia de Acari: de que fiz este assento, e assino. O Vigário Antonio Germano Barbalho Bezerra.

Aos vinte sete de novembro de mil oitocentos e oitenta e três no Sítio Conceição, depois de feitas as denunciações do estilo, confessados e examinados em Doutrina Cristã, em minha presença e das testemunhas Manoel da Silveira Borges, e Benvenuto Pereira de Araújo, se receberam em matrimônio os contraentes Vivaldo Pereira de Araújo, e Maria Quitéria da Silveira, ele, filho de Thomaz Pereira de Araújo, e Rita Regina de Albuquerque, e ela, filha  de Manoel da Silveira Borges, e Maria Quitéria Barbalho Bezerra, o nubente é natural da Freguesia de Santa Rita, e residente em Acari, a nubente natural e moradora nesta. E logo lhes dei as Bênçãos na forma do Ritual Romano. E para constar fiz este que assino. O vigário José Cabral de Vasconcelos Castro.

Manoel da Silveira Borges quando enviuvou de Maria Genérica, filha de Luiz da Rocha Pitta, casou com Maria Quitéria. No registro não há o nome dos pais dela. Observamos que Ritta Regina aparece com sobrenomes diferentes nos dois registros.

Agora, neste dia 15 de janeiro de 2015, acrescento a este artigo, o segundo casamento de Ritta Regina:Aos trinta de setembro de mil oitocentos e sessenta e nove, pelas sete horas da tarde, no Sítio Cascavel, desta Freguesia de Acari, depois de obtida as necessárias  dispensas de parentesco de afinidade, proclamas e hora, uni em matrimônio os contraentes Manoel Pires de Albuquerque Galvão e Rita Regina da Câmara, viúvos, ele desta Freguesia e ela da Freguesia de Sana Rita da Cachoeira, servatis servandis, sem impedimento algum, em presença das testemunhas Antonio Pires de Albuquerque Galvão e Sérvulo Pires de Maria Galvão, que comigo assinaram o assento, pelo qual mandei fazer este assento que assino. O Vigário Thomaz Pereira de Araújo.

Notas avulsas de Genealogia (5)

Notas avulsas de Genealogia (5)
João Felipe da Trindade (jfhipotenusa@gmail.com)
Professor de Matemática da  UFRN e membro  do INRG
Em um dos nossos artigos falamos sobre Deus Dará e os Pitta do Rio Grande do Norte. Agora, encontramos mais uma informação obtida das notas do Major Salvador Drumond. Escreveu ele: assento de batismo de uma filha de um dos maiores inimigos que João Fernandes Vieira teve em Pernambuco.
Em 5 de Janeiro de 1659, batizei no Colégio e pus os Santos Óleos a Catharina, filha do Desembargador Simão Alves de La Penha Deus Dará, Cavaleiro Professo da Ordem de Cristo, Provedor da Fazenda Real, e Juiz dos Cavaleiros; e de sua mulher D. Leonarda de Azevedo. Foram padrinhos seus filhos Manoel Alves de La Penha e Dona Aldonsa.
Lembramos que naquele artigo, aqui publicado, dissemos que Simão, a esposa Leonarda e os filhos morreram em um naufrágio quando viajavam para Portugal. Os padrinhos de Catharina, seus irmãos, tinham os nomes dos avós, pais de Simão. Outro detalhe é que o Major Salvador Drumond descendia de João Fernandes Vieira e que o velho Manoel Álvares, pai de Simão foi um dos apoiadores da Restauração Pernambucana, e foi de lá que herdou o nome Deus Dará.
Em outro artigo transcrevemos para cá, das notas do Major Drumond, o casamento de José Porrate de Moraes Castro e Margarida da Rocha. Agora, informamos, das mesmas notas, o óbito de José Porrate.
Aos 12 de Dezembro de 1718, faleceu de sua vida presente José Porrate de Moraes Castro, Capitão de Infantaria do Terço Paulista, e casado nesta Freguesia, foi sepultado nesta Matriz, em hábito de Nossa Senhora do Carmo, e não fez testamento por morrer quase repentinamente, e recebeu os Sacramentos de Confissão somente; do que fiz este assento em que me assinei. Antonio de Andrade Araújo. Coadjutor.
Outro registro das notas do Major Drumond é o óbito de Agostinho Cesar de Andrade que foi Capitão mor de nossa Província. Está lá: hoje, 16 de Setembro de 1708 anos, faleceu da vida presente o Capitão Agostinho Cesar de Andrade, de idade de 86 anos, pouco mais ou menos, natural da Ilha da Madeira, e morador nesta Freguesia, fez testamento, e seus testamenteiros o Capitão Jerônimo Cesar de Mello, seu filho, e o Sargento mor Pedro Cavalcante, seu genro, e o Reverendo João de Abreu Barreto, seu filho; faleceu com todos os Sacramentos de penitencia, Eucaristia e Unção, foi sepultado nesta Igreja Matriz; e para constar fiz este assento. O Cura Manoel Rodrigues Neto.
D. Laura Cadena, casada com o Capitão mor Agostinho Cesar de Andrade, faleceu no dia 3 de Setembro de 1701, com sessenta e cinco anos de idade; com o sacramento de penitencia, e não fez testamento. Foi sepultada na matriz de Itamaracá. O Cura Manoel Rodrigues Neto.
Lembramos que Agostinho Cesar de Andrade era da família de Maria Cesar, esposa de João Fernandes Vieira, pois ela era filha de Francisco Berenguer de Andrade.
Noutro artigo falamos sobre os Guedes Alcoforado, família presente no Rio Grande do Norte. Por isso, transcrevemos o óbito de Felipe Guedes Alcoforado, das notas de Drumond: aos 25 dias do mês de Outubro de 1689, faleceu da vida presente Felipe Guedes Alcoforado com todos os sacramentos necessários, e fez testamento solene, aprovado, em que deixou por legado de sua alma 700 missas ordinárias, e três de Rainha Santa, dois ofícios, solenemente cantados; deixou mais, de esmola, mil cruzados a uma mulata donzela forra, sua filha, 100$000 a um mulato forro seu filho, e 100$000, por obra pia, a seu irmão, o alferes Affonso Guedes Alcoforado. Advirto que o mulato se chama Manoel, e a mulata Laura. O dito Felipe Guedes era freguês desta Freguesia, morador dentro da Ilha de Itamaracá, natural deste Bispado, casado com D. Anna de Abreu, de idade de 70 e tantos anos, pouco mais ou menos, e foi sepultado em sua capela de invocação de São João Baptista, e no mesmo dia se disseram missas de corpo presente, e um ofício de corpo presente dos dois acima mencionados. De que fiz este assento que por verdade me assinei; e logo se feste outro ofício. Vigário Luiz de Figueiredo Mendes.
Vejamos o casamento de Laura Guedes Alcoforado, citada acima: Aos 9 de Setembro de 1703 anos, de tarde, na Capela São João Baptista desta Freguesia de Nossa Senhora da Conceição da Villa de Itamaracá, em presença de mim, o Reverendo Francisco (Antonio) Borges de Lemos, Vigário desta dita Freguesia, e sendo presente por títulos, o Capitão Luiz Lobo (deve ser o filho de Pedro Lelou), e o Capitão João Guedes Alcoforado, corridos os banhos e não havendo impedimento algum, casou em facie eclesie, na forma do Sagrado Concílio Tridentino, Salvador de Souza Lyra, filho legitimo do Alferes Pedro de Aguiar e de sua mulher Izabel Peres, morador na cidade de Olinda, com Laura Guedes Alcoforado, filha ilegítima  do Capitão Felippe Guedes Alcoforado, já defunto, e de Anna Guedes, crioula do Gentio da Guiné, moradora e freguesa desta dita Matriz do Bispado de Pernambuco. Do que fiz este assento, e por verdade me assinei. O Vigário Antonio Borges de Lemos.
No dito artigo sobre os Alcoforado, há um registro de casamento de um certo Felippe Guedes Alcoforado, filho de Manoel Guedes Alcoforado e Eusébia Ferreira. Esse Manoel deve ser o outro filho ilegítimo.
Noutra folha está: Aos 28 do mês de Julho de 1706 anos faleceu da vida presente, D. Anna de Abreu, viúva que ficou do Capitão Felipe Guedes e mãe do Capitão João Guedes (Alcoforado), com os sacramentos de Confissão e Comunhão, e me afirmaram não dera tempo para me mandar recado para ir dar o sacramento da Extrema Unção, foi sepultada na sua capela de São João, de seu engenho, e se lhe fez o oficio de obrigação de corpo presente, e me disseram não quisera fazer seu testamento; do que fiz este assento, e por verdade me assinei. O Vigário Antonio Borges de Lemos.
Nos apontamentos do Major, há o casamento de outra filha ilegítima de Felippe, por nome Clara Guedes Alcoforado.

Notas avulsas de Genealogia (4)

Notas avulsas de Genealogia (4)
João Felipe da Trindade (jfhipotenusa@gmail.com)
Professor de Matemática da UFRN e membro do INRG
No livro A Guerra dos Bárbaros, de Affonso Taunay, há referências ao Sargento mor de Pernambuco, Pedro de Lelou, que lá de Olinda, em 1699, tomava a defesa ardente de Moraes Navarro e dos Paulistas, na briga deste último com o Capitão mor da Capitania do Rio Grande, Bernardo Vieira de Mello. Pedro Lelou acusava Bernardo de ser um tipo sórdido e invejoso. Dizia mais que nosso Capitão mor fizera seu filho, menino adolescente, juiz ordinário da cidade do Natal e para ele obtivera uma patente de Alferes. Aliás, no nosso blog postamos os assentamentos de praça de dois filhos de Bernardo Vieira de Mello, em 1698, ambos com soldos de mil oitocentos e sessenta e oito réis: Bernardo Vieira de Mello com 14 anos e Antonio Leitão Arnoso com 13 anos.
 Anteriormente, em 1693, Pedro Lelou tinha sido nomeado Capitão mor do Ceará. Ele era, como cita Guilherme Studart, flamengo, bruxelês, filho de Ludwig Wolf e afrancesara pitorescamente o nome para Lelou. Mas Lelou não pode assumir o posto de Capitão mor porque havia uma denúncia de que falsificara certo documento a fim de proteger seu filho Luiz Lobo Albertin. Lelou conseguiu provar que as acusações eram falsas e, portanto foi expedida, em 14 de Novembro de 1694, a carta patente para o posto por três anos.
No livro da Freguesia de Itamaracá, transcrito pelo Major Salvador Drumond, já citado em vários dos nossos artigos, consta o casamento de Luiz, filho de Pedro Lelou, onde faltam algumas partes.
Aos 27 de Novembro de 1702, de manhã na Capela de São João, filial desta Matriz de Nossa Senhora da Conceição da Vila de Itamaracá, em presença de mim, o Padre Antonio Borges de Lemos, Vigário da dita matriz, sendo presente por testemunhas o Capitão João Guedes Alcoforado e o Sargento mor Pedro de Lelou, se casaram por palavras de presente, o Capitão Luiz Lobo Albertin, filho do Sargento mor Pedro de Lelou, e de sua mulher D. Maria Dias de Abreu, e Margarida Guedes; e logo tomaram as bênçãos, corridos os banhos; e não houve impedimento algum, observada a forma do Sagrado Concílio Tridentino; do que fiz este assento e por verdade me assinei. O vigário Antonio Borges de Lemos.
No documento acima não aparece o nome de Dona Margarida, mas no seguinte, onde consta o seu óbito, se obtém mais informações, inclusive o nome do pai. Aos 29 do dito mês de Julho de 1703, falecendo da vida presente D. Margarida, mulher do Capitão Luiz Lobo, com todos os Sacramentos, não fez testamento pela enfermidade lhe não dar lugar; e foi sepultada na Capela do Engenho de São João que é de seu pai o Capitão João Guedes (Alcoforado).
Nos registros de óbitos salvos, encontra-se, também, o seguinte: hoje, 25 de Setembro de 1715, faleceu da vida presente, D. Thereza, filha do Capitão mor Jerônimo Cesar de Mello, morador nesta Freguesia de Maranguape, casado com o Capitão Francisco Berenguer de Andrade, de idade de 25 anos pouco mais ou menos, com o sacramento da penitencia, Eucaristia, e unção; e para constar fiz este assento. O cura José Ferreira Guedes.
Há, ainda, nas arengas entre Bernardo Vieira e Manoel Álvares de Moraes Navarro, acusações de Pedro Lelou a Francisco Berenguer de Andrade, tio do nosso Capitão Mor, não sei se era o mesmo acima, esposo de Thereza. Diz Lelou deste Berenguer: mau homem e diabólico em fazer manifestos falsos, sem temor de Deus, homem que trazia sessenta e duas demandas, empatando-as todas sem pagar nem restituir o alheio. Verdadeiro perturbador da República, nela semeava mil cizânias, "irmão que parecia de um letrado certo David de Albuquerque, judaizante, natural de Covilhan e descendente daqueles que seguiam os execrandos ritos da Lei Velha. Real mercê de Deus fora tirar semelhantes sujeitos da praça para a tranqüilidade dos povos.
Consta ainda no livro Guerra dos Bárbaros que Berenguer conseguira que o Bispo excomungasse o Mestre de Campo, Moraes Navarro, o que levara Lelou a protestar representando que o castigo de crimes militares cabiam aos Príncipes e Generais e não aos prelados.
Há uma carta, como consta do livro Guerra dos Bárbaros, do nosso Senado da Câmara, datada de 29 de maio de 1688 para o Capitão General de Pernambuco, onde se fala em um Francisco Berenguer de Andrade: há seis meses preciosos que V. S. não tem mandado os socorros prometidos e já recomendados por Sua Majestade e pelo Governador Geral; nestas condições, fazemos seguir o procurador do povo, Gaspar Rebouças Malheiros, em companhia do capitão-mor Francisco Berenguer de Andrade, a fim de apresentar os nossos protestos; em nome de Sua Majestade, e do Governador Geral, pelo estado em que se acha a Capitania, diminuída, quase abandonada pelas forças, devido a essa falta de mantimentos e socorros que até o presente não tem chegado.
Um dos participantes ativos na Guerra dos Bárbaros era o pernambucano Manoel de Abreu Soares. Seu filho, que também participou, no tempo de Moraes Navarro, Paschoal Gomes de Lima, era casado com Helena Berenguer, que não sei se tinha parentesco com o Francisco Berenguer acima.